Escrito por: José Miguel Nunes “The harsh reality is that locals are threatened by outsiders continually cutting into their already limited wave supply.” – Nat Young O crowding assume-se como um fator social que limita a capacidade de desfrutar do turismo de surf, tanto por parte dos surfistas que visitam, como por parte dos que são visitados, pois a atração não é apenas haver ondas boas, mas sobretudo haver ondas boas sem crowd. Este dilema leva-nos para uma aparente incompatibilidade entre os interesses político-económicos do surf e os interesses sociais do surf dentro da mesma comunidade. Nick Carrol, um dos mais conceituados jornalistas de surf do mundo levanta uma questão importante: “This idea – that a surfer or surfers can claim ownership of a surf break – goes to the very heart of our moral Code. Nobody owns the waves, it is said. This may be true in a strictly legal sense, but is it true on the deeper moral level?” O surf como atividade dominada por sensações extraordinárias que se baseiam no aproveitamento direto de uma força da natureza, alcança patamares que se encontram muito para além do económico, tais como a felicidade, a relação com a natureza e os benefícios físicos, relacionados numa primeira instância, com a qualidade e diversidade das ondas, e numa segunda instância com a vivência do ambiente e cultura de surf. Envolvendo várias vertentes, como a desportiva, a de lazer ou a de aventura, os surfistas apresentam uma relação de grande proximidade com os princípios de desenvolvimento sustentável, onde o crowd se constitui como um fator extremamente importante na seleção de um destino de surf, ou seja, quanto mais crowd houver menos atrativo será o destino. Em recente entrevista, João Cotrim de Figueiredo, Presidente do Turismo de Portugal, refere que, e passo a citar, “a pressão sobre os residentes é um dos temas que mais acompanhamos de perto com as autarquias, entidades de segurança e de fiscalização. Não apenas por uma questão de coesão social, mas também de atratividade turística”. No turismo de surf em Portugal, não parece vislumbrar-se qualquer indício deste acompanhamento, até porque nem os senhores do Turismo de Portugal, nem os autarcas dos municípios onde o turismo de surf está implementado nada percebem de surf, logo a vontade politica para alterar o modelo vigente, que neste segmento continua baseado na massificação da atividade, é completamente inexistente. A insistência neste modelo, muito provavelmente levar-nos-á a situações futuras bem mais problemáticas do que as atuais, e as atuais em alguns casos são já problemáticas, com ligação direta ao que Nat Young afirmou “… hierarchies at surf spots are gradually being broken down…”. Ainda segundo o Presidente do Turismo de Portugal na mesma entrevista: “…se as pessoas deixarem de receber bem os turistas, porque de alguma forma passaram a ser mais incómodos do que benéficos, então estaremos a perder um ativo e isso não seria inteligente que acontecesse”. Pois é precisamente o que parece começar efetivamente a acontecer. O excesso de crowd em resultado do modelo adotado está a colocar em risco o bem receber que tanto nos carateriza como portugueses, e a razão no setor do turismo de surf é simples: a pressão colocada sobre os surfistas locais, que começam a ver seriamente ameaçados os seus últimos redutos de puro prazer.
0 Comentários
|
Arquivo
Dezembro 2016
|