_ Escrito por: João Paulo Jorge Existe atualmente um grande interesse em conhecer o valor das ondas, particularmente no que se refere ao surf, um desporto milenar com origem na Polinésia, desenvolvido no Hawaii, levado para a Califórnia no início do seculo XX e daí para o mundo. As ondas com qualidade para a prática do surf têm um enorme valor económico e social, muitas vezes subestimado pelos empresários e lideres políticos (não é o caso de Peniche) como é demonstrado pelos infelizes casos de Jardim do Mar (Madeira) e Mundaka (Espanha). Tomemos como referência, a título ilustrativo, alguns números: quanto ao número de surfistas no mundo não existem dados concretos e definitivos mas em 2005 eram estimados, pela International Surfing Association, 17 milhões de praticantes, distribuídos por 70 países. Já a organização Surfing Australia, em 2009, calcula esse número em 23 milhões, considerando ainda que apenas E.U.A. e Austrália agregam cerca de 5 milhões. Muito recentemente (Julho de 2011) um estudo da Universidade de San Diego estima o impacto económico anual do surf em cerca de 5 mil milhões de dólares, apenas nos Estados Unidos, considerando um gasto médio diário de 66 dólares por visitante. Por outro lado, considerando dados da indústria de vestuário ligada ao surf, esta representa muito perto de 13 mil milhões de dólares em vendas anuais segundo o estudo de mercado da Ninety 9 (uma marca criada pelo grupo Benetton a preparar-se para entrar neste mercado específico). Não sendo efetivamente um mainstream product, no âmbito da atividade turística global, parece claro que esta atividade terá já ultrapassado o estatuto de “nicho”, como ainda é habitualmente classificada por muitos. Este conhecimento do valor da onda não dispensa evidentemente o conhecimento, que se quer o mais profundo possível, de quem a usa. A alta competitividade dos tempos atuais exige que os gestores de marcas e produtos (incluo aqui os lideres políticos) tenham uma visão aprofundada dos agentes e dos fatores condicionantes do mercado e sejam capazes de utilizar, como parte integrante de suas estratégias, as perceções dos consumidores em relação ao seu produto. A compreensão do que pensa, sente e deseja o consumidor é um elemento fundamental para fundamentar a tomada de decisão. Esse conhecimento deve resultar da investigação, realizada de forma metodológica e científica. Nesse sentido, no âmbito da dissertação de mestrado em Gestão e Sustentabilidade no Turismo da Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar (ESTM), a Patrícia Reis dedicou-se a investigar o assunto o qual se encontra em fase de conclusão. Os resultados preliminares foram entretanto apresentados durante o V Congresso Internacional de Turismo, realizado em Novembro último na ESTM, dos quais se apresenta aqui uma síntese. Os objetivos do estudo consistiram em caracterizar o perfil do turista de surf, avaliar a importância dos atributos de um destino de surf e respetivas dimensões implícitas das suas motivações e, principalmente, determinar segmentos homogéneos (de turistas de surf) com base nessas dimensões implícitas. Para tal foram entrevistados aleatoriamente, durante o Rip Curl Pro 2010 realizado em Peniche, 210 praticantes de surf não residentes no concelho de Peniche, maiores de 18 anos. Relativamente ao perfil do turista de surf a caracterização sociodemográfica dos inquiridos revela que a maioria dos inquiridos é de nacionalidade portuguesa (65%), seguindo-se os espanhóis (9%), ingleses (8%) e alemães (5%) e franceses (3%). Dos portugueses cerca de 49% são provenientes da área metropolitana de Lisboa, 13% da região Oeste e os remanescentes do resto do país. A estrutura etária revela um mercado muito jovem, o que não é novidade: o grupo etário mais representado é o relativo às idades compreendidas entre os 25 e 34 anos (43,6%), seguindo os grupos etários 18-24 anos (38,1%) e 35-44 anos (15,8%). No que se refere ao nível de educação é interessante constatar que quase 60% dos entrevistados concluíram ou frequentam o ensino superior. Como referido o principal objetivo do trabalho consistiu na determinação de segmentos diferenciados de turistas de surf a partir das motivações presentes na escolha de um destino de surf. A metodologia empregue no estudo, muito sumariamente, consistiu - numa primeira fase – na avaliação da importância dos atributos motivadores na escolha de um destino (ver figura 1). Como se verifica destaca-se a importância dada a três atributos: a diversidade de ondas, a diversidade de locais e o ambiente e cultura do surf. Se os dois primeiros dependem das condições naturais e da sua preservação, o terceiro depende claramente de uma gestão estratégica do destino. _ Numa segunda fase, recorrendo a técnicas estatísticas multivariadas, foram identificados, a partir das correlações implícitas na escolha dos principais atributos, dois segmentos de turistas de surf com características diferenciadas. Um primeiro segmento de maior dimensão, reunindo cerca de 70% dos inquiridos, com predomínio do grupo etário dos 25 aos 34 anos, dos praticantes mais frequentes e incluindo a maioria dos estrangeiros dos dois principais mercados (Espanha e Inglaterra). Um segundo segmento caracterizado pelos praticantes mais jovens (predomínio do grupo etário dos 18 aos 25 anos), menos frequentes e provenientes sobretudo da área metropolitana de Lisboa.
Comum a ambos os grupos é considerarem como os dois principais atributos motivadores na escolha de um destino de surf a diversidade de ondas e de locais para surfar. Apenas diferem ligeiramente no terceiro factor mais importante: o ambiente e cultura de surf. Enquanto para o primeiro segmento, de maior dimensão e mais experiente, este atributo está praticamente ao nível dos dois primeiros, para o segundo segmento é o clima e só depois ambiente e cultura de surf. Poder-se-á concluir que a relevância dada a este atributo aumenta com a idade, a experiência e predisposição para viajar. O ambiente e cultura do surf constitui-se, pois, como um elemento muito particular, para além de diferenciador e estratégico na gestão de um destino de surf que se queira coerente e sustentável (até pelas características inerentes a essa cultura). Não só porque depende menos das condições naturais existentes (como acontece com a diversidade de tipos de ondas e de locais para surfar) e mais da qualidade e visão das acções e políticas locais, mas também porque exige o envolvimento de um conjunto alargado de actores e, muito especialmente, dos residentes. É um tema que merecerá, sem dúvida, muita atenção e que será abordado num próximo artigo. Nota: o título do artigo foi “ligeiramente” roubado a um trabalho de Sara Dolnicar sobre o surf e caraterização dos surfistas australianos, realizado em 2003, com o título “Who’s Riding the Wave? An Investigation Into Demographic and Psychographic Characteristics of Surf Tourists”.
2 Comentários
HENRIQUE CONDE
3/1/2012 10:45:36
Um artigo muito interessante,bem delineado e que nos revela as mais valias que o SURF podera num futuro muito proximo e nas mais variadas vertentes,dinamizar o turismo, congregando-o para zonas, dantes, quase desconhecidas de muitos amantes desta modalidade e PENICHE neste particular,ja deu provas de que reune excelentes condicoes para nao so a pratica do SURF, mas tambem, para a realizacao de provas do calendario internacional.....}}}
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Carlos Lopes
4/3/2012 07:44:01
Localismo é uma doença!!! Faço alguns desportos Caça submarina, golf, futebol, o mar é de todos, as praias não são de ninguém em particular, os denominados locals não têm primazia sobre ninguém!!!! A etiqueta sim, essa deve ser obrigatória emana do respeito e da vivênvcia em comunidade. Lá por haver um novato num pico a fazer asneiras, ninguém tem o direito de lhe partir a prancha, se querem ser "locals" como deviam, deveriam optar antes por ter uma postura positiva e "formadora" a quem está a aprender. Afinal os locals também aprenderam. Irei apanhar ondas em qualquer praia, respeitando sempre os outros, mas não sou dono de nada!!!!
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