Ouvi há alguns dias num programa de televisão sobre surf na RTP, não exatamente por estas palavras, mas basicamente isto: Peniche e Ericeira até podem ter as melhores ondas, mas na realidade o Algarve tem muito melhores condições para o surf. Confesso que na altura fiquei um pouco perplexo com a afirmação. Andei a pensar no assunto durante uns dias, e na realidade nem me custou muito admitir alguma verdade no que foi dito, se tivermos em consideração que o paradigma do surf se alterou por completo nos últimos anos, consequência da mediatização a que foi sujeito. Se há uns anos atrás, e não há muitos, o surf e tudo o que o suportava, assentava nos surfistas, e por consequência na máxima da onda perfeita, hoje em dia já não é bem assim. Enquanto o surf e os seus negócios dependeram unicamente dos surfistas, as coisas não correram lá muito bem em termos económicos, pois um surfista à antiga, precisa basicamente de uma prancha, um fato e pouco mais para ser feliz, e isso, todos concordamos, é manifestamente pouco para desenvolver uma economia em volta do surf. O surf cresceu, cresceu muito, e em várias vertentes, nomeadamente a turística. O turismo, acima de tudo vende sensações. No caso do turismo de surf, o que é vendido é a sensação de durante um determinado período de tempo, permitir a alguém o sentir-se surfista, e para isso, o menos importante são a qualidade das ondas. Para quem quer ter a sensação de ser surfista, chega-lhe uma prancha debaixo do braço, sol e água quente na praia, sendo as ondas um pormenor pouco importante. Era basicamente isto que aquela afirmação inicial queria dizer, e até faz sentido. Tudo mudou relativamente ao surf. Os surfistas, os verdadeiros surfistas, hoje em dia representam uma ínfima parte na economia dita do surf, senão vejamos, se quisermos ser simplistas, o que um turista paga para durante uma semana ter a sensação de ser surfista, equivale quase ao que um surfista gasta durante um ano para poder ser efetivamente surfista. Obviamente que a indústria do surf necessita dos surfistas que realmente o são, pois são eles em última instância que servem de modelo para preencher o imaginário daqueles que durante um curto período de tempo o querem ser, e serão estes últimos, que acabam por sustentar a já enorme indústria envolvente ao surf, até mesmo depois de passada a semana em que tiveram a sensação que o foram. Se mudou o paradigma, terá de mudar também a abordagem. Há um antigo ditado que diz: cada um puxa a brasa à sua sardinha, e é basicamente isto que temos que fazer. Ora, se não temos o clima que o Algarve tem, temos de vender o produto de outro modo, que nos serve entrarmos em concorrência direta com o que não temos possibilidade de concorrer. O que temos de ser capazes de fazer, é transmitir a ideia que, a sensação de ser surfista com melhores ondas e pior clima, é melhor do que a sensação de ser surfista com melhor clima e piores ondas. Este é na minha opinião o caminho a seguir para diferenciarmos o nosso produto dos restantes do ponto de vista do turismo de surf.
2 Comentários
Lourenço Mendes
28/5/2012 07:54:27
Cresci com o mar por sempre passar os 3 meses de férias em Peniche e posso dizer que é a terra do meu coração. Também digo que o mar, as ondas, o surf fazem parte do que sou e por isso com todo o respeito pelo artigo expresso duas opiniões:
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José Miguel Nunes
28/5/2012 08:52:21
Caro Lourenço Mendes
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