Escrito por: Edgar Henriques Um dia, quando me preparava para dormir, encetei a meditação sobre a obra de requalificação efetuada no Parque de Estacionamento do Lagido e espaços contíguos. Requalificação com a qual concordo plenamente, embora esta possa ferir a vista panorâmica e manifestar-se agressiva a nível paisagístico. O pórtico ali colocado é manifestamente imponente e talvez desenquadrado da linda paisagem que o Lagido nos proporciona, mas qualquer outra solução, na minha opinião, não resolveria o grave problema existente há vários anos neste maravilhoso miradouro paisagístico. Faço esta afirmação porque o “povo” gosta muito pouco de cumprir ordens, sinalética e códigos de conduta, e pelos antecedentes, não tem consciência ambiental, nem paisagística. Esta obra teve como objetivo disciplinar o estacionamento das viaturas e também o acesso de auto caravanas e afins, proibindo a permanência destas no local. Aquilo que se passava no Parque de Estacionamento do Lagido, a que eu designei por Parque de Campismo, era péssimo, pois as auto-caravanas ali estacionadas, muitas delas em permanência vários dias consecutivos, ocultavam a magnífica vista paisagística que são a ilha e o mar. Além dos aspetos já referidos salienta-se que muitos dos ocupantes deste local, não tinham as mínimas preocupações ambientais, o aspeto do local era péssimo e não era convidativo a permanecer por ali muito tempo. O cenário constituído por estendais de roupa, fatos de surf pendurados, panelas e tachos com restos de comida debaixo das caravanas, com muitas moscas por perto, tornava o espaço pouco acolhedor ou até desprezível. Outro aspeto marcante da negatividade do local situava-se no cantinho escondido entre a ETAR e o Surf Castle, era utilizado por muitos como WC, havendo nesse local um cheiro nauseabundo a urina e vestígios de fezes. Pelo que observei recentemente, e por força das obras de requalificação o espaço está agora mais aprazível, mais simpático para quem ali se deslocar, quer seja para surfar, ou simplesmente para observar a paisagem e a natureza. Quem não deve ter ficado satisfeito com a implementação destas novas medidas foram os auto-caravanistas, pois viram negado acesso a local tão privilegiado e bonito, que muitos pensavam que já tinham direitos adquiridos de permanência. Estes devem compreender que têm deveres a cumprir de acordo com o Manual das Boas Praticas do Campista, nomeadamente ao nível do estacionamento das viaturas, o qual aconselha que nos centros urbanos este deve ser provisório tendo em conta os seguintes critérios:
Salienta ainda, que a utilização da auto-caravana deve fazer-se nestes lugares:
Todos nós sabemos que a maioria dos auto-caravanistas frequentadores do Lagido não tinham estas preocupações, também não era visível o seu pensamento na preservação do meio ambiente, bem como honrar os princípios a fim de obterem o respeito de todos. Não deve ser esquecido o facto da maioria dos residentes daquele local, serem cidadãos estrangeiros, na sua maioria alemães, espanhóis e franceses. Desta forma é provável que a maioria não se enquadre nem respeite o espírito partilhado pelos auto-caravanistas. Depois de uma enorme reflexão e ter concluído que a requalificação deste espaço foi bastante positivo nos mais diversos aspetos, ambientais, paisagísticos, turísticos e desportivos, imagino que adormeci, mas deu-se uma continuidade ao meu pensamento sobre o assunto, provavelmente em sonho? Num ápice diversas imagens sobre o mundo das auto-caravanas apoderaram-se da minha mente. No meu pensamento pairou um novo cenário em plena praia do Baleal: Devido às restrições impostas no Lagido, os auto-caravanistas mudaram-se de “armas e bagagens” para o estacionamento que fica perto da praia do Baleal Camping, ocupando o espaço que vai do Bar do Bruno até ao Ponto de Encontro. Este passou a ser o espaço privilegiado para estacionar as ditas auto-caravanas e viaturas afins. Tudo o que de mau existia no estacionamento do Lagido, foi transferido para este novo local de pernoita de tantos caravanistas. Estes trouxeram consigo muitos e maus vícios, e este local tornou-se mais feio, sujo e degradado. Diversas auto-caravanas, de gente conhecida ou amiga, que partilham o espaço em grupo, repartindo estendais, confeção de refeições, bem como “charros de cannabis", inconfundível pelo aroma que deixa no ar. O dia nasceu há pouco, é vê-los sair dos seus aposentos, com um ar ensonado, ramelas nos olhos, dificuldades em encarar a luz solar e andar cambaleante, provavelmente baseado na “moca” ou “bezana” apanhada na noite anterior. No chão, junto das auto-caravanas, os vestígios de festança são ilustrados com o cenário de muitas garrafas vazias de bebida com maior predominância para a cerveja. Um som constante faz-se notar no “ar”, sendo que este se caracteriza por um misto de tosse pulmonar, que culmina com o escarrar para o chão. Em seguida alguns lavam os dentes, cuspindo para o chão uma espuma branca, com uma goma que não se evapora facilmente. As esposas vão comprar alimentação para depois servir o pequeno-almoço, no qual as crianças tem o privilégio de comer em primeiro lugar. Os homens preparam as suas pranchas de surf para tomarem o pico de assalto. De acordo com as suas conversas e vontade demonstrada, durante a primeira refeição do dia, tudo aponta para que vão mesmo tomar conta do pico. A sua imagem e fisionomia, que descrevo mais em pormenor, dois homens altos, fortes fisicamente, pelo menos de aparência, com ar pouco simpático, barba grande, um com “rastas” o outro com um corte de cabelo tipo “moicano”, são factos que só de olhar podem causar receio aos frequentadores do pico. Entram no mar. Com grande algazarra remam até ao pico, sempre com conversas em tom de voz bastante alto e intimidatório. Passam pelos surfistas que estão à espera de ondas e não fazem um cumprimento, todos esperavam pelo menos uma frase de “bons dias”. Continuam a remar e vão ocupar no pico os lugares de prioridade para apanhar as ondas. Comentam um para o outro, que o “crowd” é muito aqui neste pico, o melhor seria arranjar o modo de senhas de vez, como as utilizadas nos talhos dos hipermercados. Entra um “set” e eles movimentam-se para se colocarem em posição de apanhar as melhores ondas, tiram benefício de terem pranchas grandes e volumosas, as quais entram na onda com maior facilidade. Com uma remada mais facilitada, um deles entra na melhor onda, ainda antes de realizar o “take-off”, já gritava em tom de voz altíssimo, “esta é minha, oi …oi…”, e lá surfou a onda. Não a surfou muito bem, pois o seu estilo e nível de surf não é muito bom. A onda seguinte foi apanhada pelo outro, os das “rastas”, que antes de remar para a onda já dizia bem alto, a próxima é minha, eu vou nesta, o meu número de senha é o próximo, portanto não se coloquem na minha frente, e lá remou e apanhou a onda. Mal tinha acabado de fazer o “take-off”, e ainda não tinha entrado no “bottom”, já tinha caído, na realidade o seu nível se surf era péssimo. Depois de terem apanhado duas ondas, uma cada um, dirigiam-se para o “outside”, iam passando pelos outros surfistas e avisavam: não se ponham na nossa frente, senão levamos tudo à frente…a partir de agora quem manda no pico são os “Tubarões da Bobadela”. Entretanto aquele com o corte de cabelo tipo “moicano”, apanha uma onda intermédia, realizando um dropino monumental a um surfista que já vinha a surfar a onda, e ainda teve o desplante de resmungar e ralhar, a dizer que o surfista que tinha a prioridade, lhe tinha estragado a onda, mas não houve resposta à provocação, portanto ficou a falar sozinho. Mais tarde chegam-se os dois ao pico onde estão cerca de meia dúzia de surfistas, começam outra vez a marcar posição através da verbalização de várias palavras ou frases com o intuito de intimidar. No pico houve-se o seguinte, “Aqui quem manda são os Tubarões da Bobadela, tirem lá a senha, mas para apanhar as intermédias, pois as rainhas do “set” são nossas”. Enquanto esperam pelo “set”, o cenário no pico torna-se nojento, pois começam a cuspir na água, assoam-se, um à manga do fato de “neoprene”, outro aos dedos da mão. Que comportamento tão primitivo, que não via á muito tempo. Quando se intitularam “Tubarões da Bobadela”, pensei, mas estes gajos que não surfam nada e pelo estilo de surf feio que têm só podem ter aprendido a surfar no Rio Trancão, chegam aqui e querem ser os reis do pico? O que lhes vale é que os surfistas presentes são pacíficos e não querem problemas senão já tinham sido corridos daqui para fora. A sorte protegeu-os, o “crowd” era pacífico e não queria confusões, desta forma afastaram-se do pico, pois não estavam com paciência para aturar dois “cromos” daquele calibre, que nem mereciam qualquer tipo de resposta. Ignorar a sua presença foi a melhor atitude tomada pelos restantes surfistas presentes. Com o pico vazio de surfistas, continuaram a falar em tom alto, que se ouvia a norte e a sul do local onde estavam. Sem terem com quem partilhar as ondas, apanharam algumas, mas nunca as surfaram em grande nível, pois o seu surf era na realidade muito fraquinho. Cansados de surfar mal, e com a maré a vazar, facto que dificultava ainda mais o surf, com as ondas a tornarem-se mais rápidas e fechar bastante, saíram da água e dirigiram-se para a praia, com as suas pranchas debaixo do braço. Riam e comentavam a surfada, “epá”, viste aquela onda que dei uma grande paulada, relatava o das “rastas”, o outro, o “moicano”, explanava, viste aquele "dropino" monumental que eu fiz, foi brutal. Entretanto chegaram junto das auto-caravanas, colocaram as pranchas no chão, retiraram os “chops”, secaram-nos e posteriormente arrumam as pranchas nas respetivas capas, estas muito ressequidas do sol, com bastante sujidade de “wax” misturado com areia, colocando-as debaixo das viaturas para estarem protegidas da luz solar e do calor que se fazia sentir. Seguidamente foram despir os fatos, e despem-nos até à cintura, ficando as mangas penduradas quase a roçar na areia. Tentam secar os cabelos abanando a cabeça, da qual sai alguma água salgada, principalmente o das “rastas”, que tem um maior volume de cabelo. Este vai buscar uma toalha e começa a secar o cabelo, seguidamente coloca o fato um pouco abaixo da cintura, ficando com os órgãos genitais à vista de todos os presentes, e enquanto continua a limpar a cara com a toalha, urina para o chão. Limpa o tronco e retira totalmente o fato, mais tarde enrola a tolha na cintura seca-se e veste uns calções com um padrão de riscas amarelas verdes e pretas. O outro, o do cabelo à “moicano”, espera pela sua vez para utilizar a tolha, esta bastante suja e com aspeto de muito pesada do sal acumulado. Começa então a secar-se e a despir o fato, depois de ter colocado a toalha em volta da cintura, após tirar o fato veste-se, utilizando uns calções pretos e uma t-shirt de alças branca, bastante encardida, com um logo na frente de uma planta de “cannabis”. Agarra nos dois fato de surf e dirige-se para a beira mar a fim de os lavar e retirar a areia que estava agarrada. Já com os fatos limpos coloca-os a secar pendurados no guarda-vento do bar Ponto de Encontro, enquanto o outro, prepara umas sandes de queijo e fiambre, e duas cervejas para repor as energias gastas na surfada. Comem e conversam, ao mesmo tempo que partilham a sandes com os filhotes mais pequenos e combinam com as companheiras o planeamento do resto do dia. Depois de saciada a fome e a sede, agarram no guarda-sol e vão até ao areal. Instalam-se, estendem as toalhas, cravam na areia o guarda-sol. As esposas colocam protetor solar nas crianças e acompanham-nos nas brincadeiras à beira mar, enquanto os homens sentados nas toalhas se preparam para enrolar um “charro” que vão fumar de seguida. Num repente acordo deste sonho, fico confuso e penso, será sonho ou realidade? Levanto-me da cama, visto-me à pressa e vou até ao Ponto de Encontro, para ter a certeza daquilo que me estava a acontecer. Quando cheguei fiquei mais aliviado, pois na realidade tinha sido mesmo um sonho, no local não havia auto-caravanas, nem surfistas com mau aspeto, apenas se verificava um grande desordenamento das viaturas ali estacionadas, facto que é normal acontecer naquele parque de estacionamento. Depois de apurar que nada de novo havia naquele local, situação que me deixou bastante satisfeito, dirigi-me ao Lagido para apreciar a beleza matinal de um dia de verão. Ao chegar ao local fiquei indignado com o cenário existente, o qual me deixou bastante furioso. Nessa manhã o Parque do Lagido, tinha sido invadido por meia dúzia de “bifes”, na sua maioria compatriotas da nossa grande amiga Ângela Merkel, que na noite anterior infringiram as nossas leis e estacionaram as suas autocaravanas com dimensões que seria impossível passar pelo pórtico ali instalado, facto que me levou a pensar que tinham entrado no parque pelo sentido proibido, infringindo a lei do Código da Estrada. Para além das caravanas, havia ainda uma tenda montada, junto da arriba, bem como viaturas estacionadas a ocupar vários lugares. Classifico esta atitude de abuso e também de falta de respeito para com o nosso povo. Ao aproximar-me da vedação de madeira que separa o estacionamento da arriba, a fim de me sentar num dos blocos de granito, que supostamente, são usados como bancos, qual não foi o meu espanto, ao verificar que este estava ocupado a servir de mesa, onde três meninas louras, refasteladas em cadeiras de campismo, cozinhavam o pequeno-almoço. Para além de um amontoado de canecas e pratos, havia também um fogão de “camping”, com água a ferver para fazer, café ou chá. Na mesa havia também, pacotes de leite, bolachas, tostas, compotas e bastante lixo pelo chão. Imaginei, aquilo que aconteceria ao “portuga” se tivesse comportamento semelhante na Alemanha. Acredito que teria problemas com a polícia, no mínimo seria multado e convidado a abandonar o local. Mas como nós somos um povo muito acolhedor, não reagimos a estas faltas de respeito e abusos para não melindrar quem nos visita. O mais caricato, é a postura adotada pelas forças de segurança, as quais nada fazem em relação ao assunto, mesmo sabendo que os “campistas” estão a infringir leis e regras, facto que me deixa bastante indignado. Para evitar estes abusos, só podemos e devemos agir de uma forma, que é, não permitir estas situações, denuncia-las e convidar os infratores a abandonar os locais, informando que existem locais específicos para pernoitar, designados por parques de campismo. Os prevaricadores devem ser em primeiro abordados de forma pedagógica, no caso de continuarem a abusar, devem ser repreendidos, mais tarde convidados a sair e por último expulsos do local. É necessário que respeitem as leis, os códigos de conduta, bem como as populações locais, para que possam ser também respeitados e acolhidos de forma amistosa e afável. A sua conduta e postura irá com toda certeza influenciar a comunidade local na forma de tratamento diferenciado, isto é, se cumprirem as regras serão bem vindos, caso contrário, vão pagar as consequências dos seus atos. “Complies with the rules and you will be welcome to Peniche”
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Novembro 2016
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