Escrito por: Patrícia Reis O turismo é atualmente uma das atividades que mais contribui para a sobrevivência de numerosos territórios. A atividade turística tira partido económico dos recursos existentes e constitui um importante fator alavancador para o desenvolvimento económico. A crescente heterogeneidade nas preferências dos indivíduos torna necessário aprofundar o conhecimento dos fatores que podem influenciar o seu comportamento e o seu processo de decisão/eleição na escolha de um destino. No entanto, conhecer os consumidores não é uma tarefa fácil. Como demonstra a literatura existente sobre o tema, a motivação turística é um processo dinâmico em que interferem múltiplos fatores, internos e externos que condicionam as decisões dos indivíduos e que presidem à tomada de decisão sobre a escolha de um destino. A motivação tornou-se, assim, útil para explicar o comportamento dos turistas, sendo considerada por muitos autores, como o ponto de partida do processo de decisão. Aprofundar o estudo das motivações turísticas, nomeadamente as motivações pull (desejo dum turista visitar um destino, provocado pelo conhecimento que tem de alguns dos respetivos atributos/atrativos), a fim de dispor de informação sobre as caraterísticas e preferências dos consumidores dos destinos turísticos, revela-se assim, de particular importância e constitui um elemento-chave para o desenvolvimento socioeconómico dos destinos, sobretudo porque facilita a segmentação do mercado. Além disso, ao agrupar por afinidades, os motivos que levam as pessoas a viajar é possível identificar uma grande variedade de tipos de turismo, assim como de turistas, o que irá permitir a adequação da oferta existente, ou a desenvolver, às motivações da procura. Neste âmbito, o turismo desportivo e náutico (participação ativa ou passiva num desporto competitivo ou recreativo), responde a motivações múltiplas, apresentando-se como uma forma de aliar o lazer à prática desportiva/náutica, consolidando-se no turismo de surf como uma atividade realizada em locais onde predomina o contacto com a natureza, aliada à contemplação do local. O surf, enquanto atividade desportiva é simultaneamente uma atividade turística/económica. Assim, para os operadores turísticos é considerado uma atividade turística/económica, mas para os surfistas o surf é um desporto competitivo, uma atividade de lazer, um estilo de vida e/ou uma obsessão. Esta perceção é significante para o turismo de surf, porque os turistas de surf primeiro são surfistas e depois turistas (Buckley, 2002). Consequentemente, este conceito afeta o seu comportamento na indústria do turismo, uma vez que as motivações para a viagem se prendem, numa primeira instância, com a qualidade e diversidade de ondas, numa segunda instância com a vivência do ambiente e cultura de surf, ou seja, a vida em torno do oceano e a cultura da praia. Neste ponto de vista, o surf como desporto (a procura da onda perfeita) e o ato de viajar são dois comportamentos/motivações que se cruzam, uma vez que os surfistas se aventuram em experiências de viagem com o objetivo de surfar as ondas perfeitas. Outro facto relevante é que o surf como estratégia de marketing atrai para uma região tanto o turista praticante como o turista simpatizante (espetadores e companheiros não surfistas). O praticante tanto pode ser atleta, como espectador, é igualmente consumidor de serviços e um futuro divulgador da região. Durante a sua estadia usufrui dos serviços e da infraestrutura como outro turista, porém com nível de exigência diferenciado em razão do seu padrão de consumo. Neste contexto, surgiu a necessidade de aprofundar a investigação científica relativamente ao segmento de turismo de surf, essencialmente pela escassez de produção de conhecimento relativa às diversas dimensões desta atividade, e que deu origem à dissertação de mestrado em Gestão e Sustentabilidade em turismo, da Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar (ESTM). Para tal foram fixados um conjunto de objetivos que permitiram, não só caraterizar o perfil do turista de surf, como avaliar a importância dos atributos de um destino de surf e respetivas dimensões implícitas das suas motivações e determinar segmentos homogéneos com base nessas dimensões implícitas, pelo que recorreu-se ao uso de técnicas de estatística multivariadas (análise fatorial e de clusters). Relativamente ao perfil do turista de surf (*) a caracterização sociodemográfica dos inquiridos revela que a maioria é de nacionalidade portuguesa (65%), seguindo-se os espanhóis (9%), ingleses (8%), alemães (5%) e franceses (3%). Dos portugueses cerca de 49% são provenientes da área metropolitana de Lisboa, 13% da região Oeste e os restantes do resto do país. Quanto à estrutura etária o grupo mais representado é o relativo às idades compreendidas entre os 25 e 34 anos (43,6%), seguindo os grupos etários 18-24 anos (38,1%) e 35-44 anos (15,8%), o que revela um mercado muito jovem. No que se refere às habilitações literárias constata-se que cerca 60% dos entrevistados concluíram ou frequentam o ensino superior/pós-graduado. Quanto à situação laboral, os dados revelam que a maioria dos turistas está no ativo. Quanto à frequência com que praticam a modalidade, a maioria dos inquiridos pratica-a entre duas a três ou mais vezes por semana (55.7%), o que sugere a existência de dois grandes grupos de turistas de surf: os turistas de surf habituais e os turistas de surf ocasionais. Entre os destinos de surf portugueses, destacam-se Peniche, Ericeira e Sagres como as principais preferências. Ao considerar todos os destinos de surf (nacionais e internacionais) as preferências continuam a ser Peniche e Ericeira, com a Indonésia e o Havai a ocupar o terceiro e quarto lugar. Pelos resultados obtidos constatou-se que, de um modo geral, os turistas de surf reconhecem que todos os atributos enumerados (gerais e específicos) são responsáveis pelo motivo da viagem/escolha do destino. No entanto, a diversidade do tipo de ondas, a diversidade dos locais para surfar, o ambiente e cultura do surf e a altura média das ondas, são identificados como os atributos centrais na escolha de um destino de surf. Os atributos periféricos, ou menos relevantes na escolha de um destino são a diversidade do comércio/serviços e o património cultural. Ou seja, são os atributos específicos do destino, aqueles que dependem das condições naturais e da sua preservação, que mais influenciam as escolhas dos praticantes. Numa segunda fase do estudo, foram identificados dois grupos distintos de consumidores de turismo de surf, cada um destes segmentos atribui valorações diferentes aos fatores de escolha. O segmento 1, de maior dimensão, representa 70% dos inquiridos com idades compreendidas entre os 25 a 34 anos, menos frequentes quanto à prática do surf, inclui a maioria dos estrangeiros provenientes de Inglaterra e Espanha, considera Peniche, Ericeira e Linha do Estoril como principais destinos de surf e atribui maior relevância a diversidade de tipos de ondas, a diversidade de locais para surfar e o ambiente e cultura do surf como os principais atributos motivadores na escolha de um destino de surf. O segmento 2, de menor dimensão, representa 30% dos inquiridos e é caracterizado pelos praticantes mais jovens (18 a 24 anos), mais frequentes, provenientes da área metropolitana de Lisboa, considera Peniche, Ericeira e Sagres como principais destinos de surf e atribui maior relevância a diversidade de tipos de ondas, a diversidade de locais para surfar e ao clima como os principais atributos motivadores na escolha de um destino de surf. A análise realizada mostrou que a grande diferença entre os dois grupos no processo de escolha do destino está no atributo ambiente e cultura do surf. Este é, então, o atributo diferenciador e estratégico na gestão de um destino de surf e no qual se afigura pouco arriscado investir recursos ou incorrer em custos de oportunidade. A sustentabilidade do destino depende, assim, da relação existente entre o surf e a terra, não se podendo dissociar a atividade desportiva – o surf, da praia e do ambiente onde a atividade é praticada e/ou observada. Neste sentido, é preciso que a comunidade se identifique com a realidade do surf e dos surfistas – a sua cultura e o seu lifestyle, e se embrenhe com ela. De salientar que o ambiente e a cultura do surf influenciam, não só os praticantes mas todos os que se querem associar a essa cultura, o que torna este segmento de turismo num importante fator de desenvolvimento. Desta forma o resultado positivo ou negativo da experiência deste tipo de turista não depende unicamente das condições naturais existentes, como a diversidade do tipo de ondas e dos locais para surfar, mas também da oferta de outros atrativos, que possibilitem aos indivíduos descobrir e vivenciar o ambiente e a cultura do surf. É essa experiência que o turista de surf procura e que o motiva a viajar para um destino de surf: fazer, ver, cheirar, ouvir e falar de surf. Tema que será abordado na segunda parte deste artigo. (*) O universo inquirido foi constituído pelos praticantes de surf, não residentes no concelho de Peniche, que assistiram ao evento Rip Curl Pro Portugal 2010, realizado em Peniche entre 7 a 18 de Outubro de 2010. (continua...)
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Escrito por: Edgar Henriques Atualmente os “Media” dão um grande destaque ao conceito “Sustentabilidade”, quase sempre associado ao Desenvolvimento Sustentável. Este conceito pode ser sintetizado da seguinte forma: Compatibilização das infraestruturas e das atividades humanas com o ambiente e os seus processos naturais, de forma a não exceder os limites da capacidade de regeneração dos recursos naturais, não excedendo as capacidades, de carga e de assimilação do meio. Segundo o Relatório da Comissão Mundial do Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, 1987 – Relatório Brunddtland), que descreve Desenvolvimento Sustentável “é aquele que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade e as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades” Podemos interrogar-nos se o Desporto deve ou não fazer parte deste processo e de que forma pode intervir positivamente na procura do equilíbrio ambiental e consequentemente contribuir para uma melhoria da sustentabilidade. O Desenvolvimento Sustentável do Desporto, tem gerado muita controvérsia ao nível dos conceitos, mas deverá ser realizada uma reflexão para que se possa chegar a um entendimentos conclusivo sobre esta matéria. Segundo Da Costa (1997), “ promover uma sociedade sustentável é prever o desenvolvimento e a proteção ambiental como forças complementares, mais do que antagónicas, o que significa criar padrões de desenvolvimento de acordo com as necessidades e limitações da natureza”. No que respeita ao desporto este autor afirma “ que desporto sustentável será quando a sua materialização respeitar os valores intrínsecos da natureza e dele próprio”. Ao longo dos tempos, tem aumentado o numero de trabalhos de investigação sobre esta temática, alguns apontam para resultados na assunção de compromissos, por parte das entidades envolvidas no fenómeno desportivo, sendo que estas visam a normalização da produção e consumos desportivos, tendo em conta a harmonia com a natureza e sem risco de danos ecológicos. A Agenda 21 do Movimento Olímpico – Desenvolvimento Sustentável do Desporto, aprovada pelo COI, estabelece princípios de sustentabilidade aplicados ao desporto, bem como um quadro para sua implementação. Este quadro normativo não se limita ao desporto olímpico, os seu propósitos são extensíveis a todo o fenómeno desportivo, pelo que solicita o envolvimento de todos, Movimento Olímpico, Federações, Clubes, Organismos Governamentais, Organismos Não Governamentais, Empresas e Pessoas Singulares, no sentido de integrarem o desenvolvimento sustentável nas suas politicas e atividades. No sentido de contribuir para esta nobre causa, muitas Federações Desportivas Internacionais tem vindo a definir políticas ambientais, programas e códigos de conduta extensíveis a praticantes e organizadores de eventos das modalidades que tutelam. Paralelamente tem surgido outras organizações cuja missão é contribuir para o desenvolvimento sustentável do desporto, através do planeamento, aconselhamento e credenciação no âmbito de programas de gestão e educação ambientais. Em Portugal no que diz respeito ás questões ambientais ligadas ao Surf é muito bem representado pela Organização Não Governamental S.O.S. Salvem O Surf. Chernuscenko (1994 e 2011), enumera um conjunto de princípios assumidos na sociedade moderna, que considera constituir uma base para a instituição de um modelo de desporto mais sustentável: Com base neste princípios e eventualmente outros, só poderá surgir uma nova ecologia do desporto, se de facto forem assumidos por todos compromissos que resultem na implementação de medidas objetivas de proteção ambiental.
Segundo o que foi escrito e com base em estudos sobre a matéria, é incontornável dissociar o surf deste contexto, ele integra ativamente o processo, senão veja o seguinte: O Meio Ambiente e a Natureza são utilizados, a nível dos seus recursos naturais sob múltiplas formas neste procedimento, pois as atividades económicas ligas ao surf tiram benefícios da natureza ao nível da provisão de matérias-primas, e também para suporte das atividades que desenvolvem, não esquecendo os resíduos e a poluição que provocam. Podemos afirmar que o Surf pode causar impactes ambientais no seu processo de desenvolvimento, facto este poderá ter como alicerce o aumento de praticantes da modalidade, a mediatização dos eventos, este acréscimo leva a que o processo seja mais acelerado e os seus efeitos negativos surjam em diversas direções. O crescimento do surf aumenta as necessidades em equipamentos técnicos, que leva a um aumento da produção industrial, que significa um aumento da poluição e um elevado gasto de recursos naturais. Não podemos também esquecer que o aumento de praticantes e público que acompanha os eventos da modalidade causam desequilíbrios no meio ambiente. Estas pessoas ligadas ao fenómeno do surf, invadem as praias e criam situações de impacte ambiental negativas a nível dos ecossistemas, nomeadamente na produção de resíduos (lixo), erosão dos solos (dunas e arribas), a flora também sofre distúrbios, sendo que a fauna também pode afetada neste processo. Eu sei, que este tema pode gerar controvérsia, pois na generalidade quase todos os surfistas se auto intitulam de “Ambientalistas ou Amigos do Ambiente”, não tenho duvidas disso, muitos se tem unido em torno de causas ambientais, mas temos o dever de pensar “mais alem” e refletir sobre diversos temas como:
Se pensarmos bem, quando vamos surfar necessitamos de um conjunto de artefactos e meios, que provavelmente, utilizados em nosso benefício e prazer, já provocaram e causaram elevados danos ao ambiente e natureza. Não quero com isto dizer para deixarem de surfar, nada disso, vamos é ter a consciência de tentar minimizar os danos, como por exemplo comprar equipamento reciclado e “amigo” do ambiente, ou privilegiar compras em empresas que se preocupam com a natureza e que tenham projetos ambientais, incentivar os outros surfistas a boas práticas ambientais, dinamizar a educação ambiental, contribuir para a criação de um código de conduta ambiental do surfista. Esta será uma forma ativa de contribuir para a proteção do ambiente e consequentemente, dar o contributo para o desenvolvimento sustentável do desporto. A humanidade depende da natureza para a sua sobrevivência, por isso temos dever de a proteger, para poder-mos viver com ela em plena harmonia. O surfista para desfrutar do seu desporto, também depende da natureza e meio ambiente, por este facto temos o dever de nos empenhar na sua preservação e proteção. Todos os surfistas devem assumir o papel de “Guardião do Templo”, sendo este que para nós é representado pela Natureza, o Mar e as Ondas. A sustentabilidade do nosso tão “amado” desporto, está nas nossas mãos, mas depende da união, dedicação, empenho e compromisso de todos os surfistas. Confiem na Sustentabilidade desta ideia. |
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Novembro 2016
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